Você vende felicidade

Autor: Ricardo J. Botelho

Os Corretores de Imóveis devem entender o que representa de fato o lar. Antes de ser um espaço físico, o lar é o não espaço da casa. Ritualizado e mítico, o lar é a alma da casa e paraíso da nossa individualidade privada.

A felicidade é o produto mais consumido no mundo moderno. Nunca se vendeu tantos livros de auto-ajuda, drogas contra a depressão, seminários e workshops que ensinam como ser feliz. O lar é um dos mais importantes fatores nessa busca da felicidade. Os Corretores de Imóveis devem entender o que representa de fato o lar. Antes de ser um espaço físico, o lar é o não espaço da casa. Ritualizado e mítico, o lar é a alma da casa e paraíso da nossa individualidade privada. O lar caracteriza-se por ser um espaço imaginário, simbólico. Por isso, tudo que envolve o processo de decisão para a compra do lar, por exemplo, está associado a uma complexidade de fatores irracionais que interferem na seleção e definição da aquisição. Afinal, não estamos buscando um teto, mas um espaço onde o nosso ideal de felicidade deve ser materializado. Portanto, aqueles que procuram trabalhar os fatores racionais de compra acabam malogrando nessa tarefa de envolver o cliente, compreender o seu universo de relações e preocupações e ajudar na decisão de compra.

Tenho dito que, muitas vezes, a mulher quando se decide pela troca do lar, busca saciar o desejo da construção de uma nova relação familiar. Sem poder trocar de família, essa mulher sonha mudar o comportamento neste novo espaço. Um claro ritual de nova pactuação implícita de relações, sempre de olho na busca de felicidade, essa verdadeira utopia que nos move neste planeta cada vez mais enlouquecido.

Em essência o Design e a Arquitetura nos falam sobre o tipo de vida que deverá desenvolver-se mais adequadamente dentro e ao redor dos lares e dos objetos que nele se encontram. O edifício e os objetos nos falam de certos estados de espírito que buscamos incentivar e sustentar. Enquanto nos mantêm aquecidos e nos ajudam mecanicamente, eles nos convidam a sermos tipos específicos de pessoas. Eles falam de visões de felicidade.

Descrever um prédio como belo, portanto, sugere mais do que uma simples afeição estética; implica uma atração pelo estilo particular de vida que esta estrutura está promovendo com seu telhado, maçanetas, janelas, escadas e móveis. Sentir uma sensação de beleza é sinal de que encontramos uma expressão material de certas ideias que temos do que seja viver bem.

Nas formas, texturas e cores construímos uma personalidade real, aquilo que somos, ou idealizada, algo que gostaríamos de ser. Alguns buscam em um projeto de interiores valores nem sempre presentes em si mesmos: força, tranquilidade, juventude eterna, graça, leveza.

Nossa amor pelo lar é, por sua vez, um reconhecimento do quanto a nossa identidade não é auto-determinada. Precisamos de um lar no sentido psicológico tanto quanto físico para compensar uma vulnerabilidade. Precisamos de um refúgio para proteger nossos estados mentais, porque o mundo em grande parte se opõe às nossas convicções. Precisamos que nossos quartos nos alinhem com versões desejáveis de nós mesmos e mantenham vivos os nossos aspectos importantes e evanescentes.

Muitas vezes buscamos na arquitetura consertar aquilo que está errado em nós, ou suprir o que nos faz falta.

O que nos atrai no Design: força, leveza, sensualidade, resistência, modernidade, segurança, bondade, elegância, coerência. Fatores que nos movem no processo de escolha. Existem tantos estilo de beleza quanto de felicidade.

Neste artigo são citados conceitos expressos no livro Arquitetura da Felicidade, de Allain de Botton.